As redes sociais acordaram nesta quinta (7 de junho de 2015) com comentários sobre a “morte de Saruman”. É compreensível, mas pouco, muito pouco quando se fala de Christopher Lee – ator britânico morto aos 93 anos.
Se for para estigmatizar, falemos da “morte de Drácula”, de resto um personagem muito mais influente na cultura popular que o mago malvado de J.R.R. Tolkien.
Sir Christopher Frank Carandini Lee foi o maior dos vampiros na tela. Um fã purista do cinema de horror apontará o misterioso Max Schreck em “Nosferatu”, criado no mesmo 1922 em que Lee nasceu, como o rei dos sanguessugas cinematográficos. Outro lembrará que a figura clássica do Drácula aristocrático e de fraque foi criado por Bela Lugosi em 1931.
Este fã vai de Lee. Os motivos começam numa contradição: ele odiava o fato de o conde ter poucas falas, nenhuma tirada do livro original de Bram Stoker (1897), no clássico de 1958 em que encarnou pela primeira vez o personagem.
A coisa só piorou nas várias sequências, uma pior do que a outra, forçadas por lucrativos contratos. Em “Drácula, o Príncipe das Trevas” (1966), Lee entra mudo e sai calado –a lenda alimentada por ele diz que as falas eram ruins demais, algo que o roteirista naturalmente negou.
Só que a limitação acabou exacerbando uma criação visual única: o conde frio e implacável, esguio e sempre vestido de preto. O silêncio era compensado por uma animalidade sedutora, não acuada como a de Schreck e seu conde Orlock. Exatamente como o conde de Stoker no livro, as mocinhas se desmanchavam pelo vilão antes de terem suas jugulares degustadas.
Desta forma, Lee resgatou o contexto de embate entre a sexualidade e repressão, entre as descobertas da psicanálise e o ocaso da era vitoriana, que marcam o conde literário.
Por fim, olhos vermelhos e sangue falso a rodo, marcas registradas das produções da Hammer Films, completavam a criação de um modelo definitivo para todos os Dráculas dali em diante – de Jack Palance a Gary Oldman, passando por Frank Langella e uma longa linhagem de canastrões.
Os talentos de Lee eram variados, e as novas gerações foram apresentados a ele pela ponta na malfadada “nova trilogia” de “Guerra nas Estrelas” e pelo supracitado Saruman de “O Senhor dos Anéis”, além de diversos papéis menores em que apenas sua presença e a profunda voz de baixo-barítono era capaz de dar gravidade ao mais lateral dos personagens.
Sua voz, aliás, lhe serviu numa infinidade de “voice-overs” e óperas, além de também para gravar inacreditáveis discos de heavy metal quando já era octagenário. Nos últimos dois anos, lançou discos com covers metaleiras de músicas natalinas, um espanto pelo bizarro e pelo sucesso comercial: foi o mais velho cantor a entrar no top 100 da Billboard, na posição 22 em 2013.
Lee considerava que sua melhor perfomance ocorreu em 1998, quando viveu o fundador do Paquistão, Muhammad Ali Jinnah, e gostava especialmente de “O Homem de Palha” (1973).
Mas, provavelmente para seu desgosto, o papel que o definiu foi o do velho conde da Transilvânia. Nunca houve Drácula como sir Christopher.
11062015 – MORRE UMA LENDA:
Sir Christopher Lee, infelizmente, faleceu aos 93 anos após ser hospitalizado por problemas respiratórios e insuficiência cardíaca.
O ator veterano ficou conhecido mundialmente por ter encarnado Drácula mais de dez vezes, Saruman na Trilogia do Senhor dos Anéis, Conde Dookan em Star Wars e muito mais.
O ator faleceu no domingo e a decisão de anunciar sua morte apenas dias depois veio de sua esposa que queria informar os familiares antes. Os dois foram casados por mais de 50 anos.
Além da carreira cinematográfica, Lee também lançou álbuns de Heavy Metal e em 2009 foi condecorado como cavaleiro pelos serviços ao cinema e caridade, além de ter sido honrado pelo Bafta em 2011.
Sua carreira no cinema começou em 1947 em Escravo do Passado, mas só nos anos 50 quando Lee foi trabalhar com a Hammer que ganhou fama. Seu primeiro filme com o estúdio foi A Maldição de Frankenstein em 1957.
Nos anos 70, Lee continuou no gênero de terror com O Homem de Palha, um filme que ele mesmo considerava como o melhor de sua carreira. Em 1974, ele interpretou o vilão de 007 contra o Homem com a Pistola de Ouro e logo depois recusou um papel em Halloween – A Noite do Terror, o que o próprio ator julgou como sendo o maior erro de sua carreira.
Sua preocupação de ficar ligado apenas a terror fez com que ele participasse de Aeroporto 77 e 1941 – Uma Guerra Muito Louca. Sua carreira ganhou força novamente em 2001 quando foi escalado para interpretar Saruman na trilogia do Senhor dos Anéis e logo depois como Conde Dookan em Star Wars: Episódio II – Ataque dos Clones e Star Wars: Episódio III – A Vingança dos Sith.
Ele se tornou também um frequente colaborador de Tim Burton, participando então de A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça, Noiva Cadáver, A Fantástica Fábrica de Chocolate, Alice no País das Maravilhas e Sombras da Noite.
Em 2010, Lee lançou seu primeiro álbum completo, Charlemagne: By the Sword and the Cross. O recebimento foi ótimo e ganhou inclusive premiações do Metal Hammer Golden Gods. Em 2013, seu single Jingle Hell entrou para posição 22 da Billboard, tornando ele o artista mais velho da história a entrar nas paradas.
Ainda há um filme com Lee para ser lançado, Angels in Notting Hill, onde será uma criatura quase divina que cuida do universo. Em 2013, Lee falou sobre seu prazer em atuar: “Fazer filmes nunca foi um trabalho para mim, e sim minha vida. Eu tenho outras paixões, eu canto, escrevo livros, mas atuar é o que me mantém motivado, é o que eu faço e o que dá propósito à minha vida”.