Por David Piraino
Há 31 anos morria o ator Telly Savalas. Seu maior sucesso foi interpretando o Tenente Theo Kojak, em Kojak (1973/78), uma das séries de maior sucesso nos anos 70. As histórias se passam em New York e trazem Kojak como um detetive extravagante da polícia, que se destaca por ser totalmente careca, pelo senso de humor sarcástico e cínico e por sua mania de chupar pirulitos.
artigos-telly-savallasTelly era meu ídolo de infância e, de fato, seu papel como Kojak o imortalizou. O policial era durão e careca, nunca agiu acima da lei, em uma época que isto não era modismo. Kojak fez muito sucesso também no Brasil, onde em 1974 virou até marchinha de carnaval.
Mas o ator Telly Savalas estava muito além do papel do policial careca. Como fã, acompanhei seus primeiros papéis no cinema. Em um deles, aparece com cabelo (e muito!), fazendo o papel de um gângster no filme “O Homem do Diner’s Club” (The Man with The Diner’s Club, 1963), ao lado do ator Danny Kaye.
Gostaria de compartilhar com vocês uma pequena homenagem ao homem que foi um ícone de sua geração, um símbolo sexual (Telly casou oficialmente por cinco vezes e teve muitos filhos) e também ao tipo de ator que não existe mais no cinema e na televisão: aquele que encarna perfeitamente um personagem e fica marcado ele para sempre (bom, ainda tem o Leonard Nimoy).
Telly Savalas nasceu em 1922, na cidade de New York. Seu nome de batismo foi Aristotele Savalas. Filho de imigrantes gregos, com mais quatro irmãos (o mais novo, George, seria seu parceiro na série Kojak), nunca imaginou entrar para o show bizz. Seu pai era dono de um mercado e, até seus cinco anos de idade, a família só se comunicava na língua grega. Quando adolescente, Telly trabalhava com seu pai no mercado e, já que era excelente nadador, aceitou emprego como salva vidas.
A vida ia bem, até o dia em que não conseguiu salvar um homem que se estava se afogando. O fato mudou completamente sua vida. Entrou no exército e combateu na Segunda Guerra. Quando deu baixa, nos anos 1950, resolveu procurar um emprego diferente e arrumou uma vaga em uma rádio local de Long Island, graças a sua voz grave e marcante. Telly se interessava bastante pelo rádio e passou a apresentar um programa chamado “Telly’s Coffeeshop”, uma espécie de talk-show radiofônico. Teve a honra de conversar com muitas celebridades do cinema, como a atriz Ava Gardner, influenciando na sua decisão em se tornar ator.
Chamado por um amigo para acompanhá-lo para audição em um teatro local, o físico de Telly chamou a atenção dos produtores do teatro e acabou ganhando um dos papéis na peça. Telly gostou tanto que ficou por três anos dirigindo e atuando em peças locais neste teatro, que também ficava em Long Island.
Em 1959, decidido a se tornar ator de cinema, partiu para a costa leste dos EUA (Hollywood). No início, como sempre, conseguiu apenas pontas em seriados de tevê, como Cidade Nua, Os Aquanautas e tantos outros. O ator Burt Lancaster, que no início dos anos 1960 possuía uma produtora de filmes chamada Hetch/Lancaster, selecionou Telly para o seu primeiro papel no cinema, no filme “Os Selvagens” (The Young Savages, 1961).
Burt gostou tanto de Telly que o convidou para o seu próximo filme, chamado “O Homem de Alcatraz” (The Birdman of Alcatraz, 1962), no papel de Feto Gomez. O trabalho garantiu a única indicação de Telly ao Oscar em sua vida, como coadjuvante.
Ao contrário de outros atores, Telly alternava papéis no cinema e na tevê, não recusando nenhum trabalho. Isso permitiu caracterizar personagens diversos, de pai de família a um criminoso, por exemplo.
Telly Careca (mas todo mundo nasce assim, não?)
Em 1965, Telly foi chamado para interpretar o papel de Pôncio Pilatos na produção “A Maior Estória de Todos os Tempos” (The Greatest Story Ever Told, 1965). O papel exigia que Telly raspasse a cabeça, o que o agradou e nunca mais deixou seu cabelo crescer. Com a nova aparência, continuou a aparecer em filmes para o cinema, tevê e como convidado em seriados.
Em 1972, o produtor Abby Mann selecionava atores para um telefilme chamado “Os Assassinatos Marcus Nelson” (The Marcus Nelson Murders, 1973) para a Universal Studios. Baseado em fatos reais, o longa mostrava as investigações de um certo Tenente Theo Kojak em um caso de duplo assassinato. O filme fez muito sucesso na televisão, o que motivou o produtor a criar uma série baseada no personagem, que se chamaria Kojak.
Se Marlon Brando Pode…
No início, Telly não queria se fixar em uma série, mas quando soube que seu papel seria oferecido ao ator de peso Marlon Brando, aceitou o desafio. Com Kojak, Telly teve o reconhecimento merecido. Passou a ter fama internacional, um enorme sucesso que criou até alguns modismos entre os fãs, como fumar cigarrilhas da marca More — lançada no Brasil como Du-Maurier –, chamar todo careca de Kojak e, claro, chupar pirulitos. Até onde descobri, Telly tinha este vício por que queria deixar de fumar.
Mas a série também seria sua maldição…
Exímio jogador de cartas e frequentador das mesas dos melhores cassinos de Las Vegas, Telly lá conheceu Frank Sinatra e seu Clã (Sinatra, Sammy Davis Jr., Dean Martin e Bing Crosby). Sinatra o incentivou a montar um show em um cassino de Las Vegas, o Sahara, onde o showman Telly cantava e dançava. Sim, você leu corretamente: cantava! O show foi um tremendo sucesso, viajando para o mundo todo, inclusive o Brasil em 1975, com espetáculos no Rio de Janeiro e São Paulo.
Quando os astros estão no auge da popularidade, tudo a eles é permitido. Abrem-se todas as portas para oportunidades e todo o tipo de extravagâncias. Não foi diferente com Telly.
Com o sucesso e o dinheiro ganho em Kojak, o ator comprou uma coleção de carros antigos, de Pontiacs a Cadillacs. Tinha seu próprio cavalo de corrida, o Telly Pop, e o sucesso de seus shows abriu uma outra oportunidade: a gravação de discos e shows na tevê. Telly gravou sete álbuns muito bem produzidos e arranjados, onde cantou músicas folclóricas, sucessos da época como “If”, além de músicas da dupla Lennon & McCartney. Todos estes álbuns foram lançados no Brasil e, eu mesmo, possuo três deles.
O que eu acho de Telly como cantor? Bem, como ele próprio disse, “eu não sou cantor; fui convidado a gravar um disco”.
No início de 1977, a série Kojak dava sinais de queda na audiência. As pessoas já não se interessavam pelas aventuras do Tenente careca. Telly sabia que a série teria um fim e precisava de um gancho para aproveitar a popularidade que ainda lhe restava. Assim, dirigiu alguns episódios da penúltima temporada da série e, após as filmagens, tentou uma cartada final: escreveu o roteiro, produziu com verba própria, dirigiu e estrelou o longa-metragem cinematográfico “Além da Razão” (Beyond Reason, 1977). O resultado foi um drama pesado, arrastado e monótono. Mesmo com um elenco de amigos de peso, como Diane Muldaur, o filme não conseguiu ser lançado comercialmente.
Por razões que eu ainda desconheço, o filme só foi lançado no Brasil em VHS, pela extinta produtora Phoenix Vídeo, no final dos anos 80. Eu tive esta fita até pouco tempo atrás e o papel de Telly não era adequado ao que estava acostumado a fazer.
Com o cancelamento de Kojak em março de 1978, Telly encontrou dificuldades em conseguir trabalho. Tal como aconteceu com Adam West após Batman, os produtores achavam que ele estava muito identificado com o personagem e conseguiu somente papéis em filmes “B” e em telefilmes, alguns deles com qualidade, mas não sendo suficientes para reaquecer sua carreira. Um telefilme estrelado por Telly, chamado “O Detetive de Hollywood” (The Hollywood Detective, 1989), lançado também aqui no Brasil em VHS, serve como uma espécie de autobiografia, onde o personagem tem os mesmos problemas que o ator.
Kojak: o Retorno
Em 1985, muitas séries que outrora fizeram sucesso estavam de volta através de reunions ou novas reedições. Animada com o retorno da série Perry Mason — exibida nos anos 50 com grande sucesso –, através da produção de filmes especiais para a tevê, a Universal chamou Telly para uma reunião a portas fechadas. Foi anunciada a volta da série Kojak na forma de telefilmes, sem o elenco original, apenas com seu irmão George, o Sargento Stravos (George participou apenas do primeiro filme, pois faleceu em 1987).
Foram sete telefilmes, produzidos de 1985 a 1990, sendo que, neles, Kojak subiu para inspetor.
Dois deles foram lançados em VHS no Brasil: “O Caso Belarus” (The Belarus File, 1985), o filme que “ressuscitou” o personagem, onde Kojak desvenda uma conspiração do governo para encobrir chefes de campos de concentração da Alemanha Nazista; e “Kojak e o Preço da Justiça” (Kojak and The Price of the Justice, 1987), onde o inspetor investiga uma estranha mulher, interpretada pela ótima atriz Kate Nelligan, acusada de assassinar seus dois filhos.
A Doença e o Fim
Em 1990, Telly foi diagnosticado com câncer de próstata, do mesmo jeito que seu pai. Nesta época, fazia uma aparição ou outra na tevê, mas terminou seus dias em uma espécie de bar que ele comprou, reformou e administrou, o Telly’s, localizado dentro dos estúdios da Universal, na cidade de Los Angeles. Nele, passava o tempo jogando cartas com os amigos e, às vezes, servindo drinks no balcão. Faleceu em 22 de janeiro de 1994, um dia após a festa de aniversário de 72 anos, ao lado de suas ex-esposas e filhos, deixando um legado no cinema e televisão, além de uma fortuna pessoal de mais de 6 milhões de dólares.
Frases Famosas
“Cantor, eu? Não, fui convidado a gravar um disco…”
“Careca, bem todo mundo nasce assim, não?”
“Escuta aqui, neném…”
“Só desejo ter tempo suficiente para criar meus filhos…”
“Quem é que te ama, neném?” (Who loves y’a, baby?)
DEMIS E ADELE EM 2015: